sábado, 31 de dezembro de 2011

De onde eu vim
Não tem mar
Onde eu vim parar?

Atraquei
Nesse cais
Por amor demais

"A enorme maioria dos médicos que visitei nos últimos tempos me disse para eu procurar um analista e não um médico. Sim, doutor, eu sofro demais, choro demais, sinto demais, sou intensa demais, diferente demais. Mas, independente de quanto sofro com as coisas, ou com que coisas, esta sou eu.
Para curar qualquer problema, era preciso parar de lutar contra mim mesma. Era preciso me aceitar, me descobrir, me pesquisar, me amar e me fazer cada dia mais feliz.
Na situação em que eu vivia, era cômodo colocar a culpa nas circunstâncias: "Estou infeliz porque não moro com quem amo" ou "Estou infeliz porque não posso fazer o que quero na hora que eu quero". Então tomei coragem e fui ver de perto. Eu me juntei com meu broto, passei dias sozinha, fiz o que queria na hora em que dava vontade. E deparei comigo mesma. Deparar consigo mesma parece uma maravilha do crescimento. Pois nascemos ouvindo milhões de regras, deveres, morais... E viciamos o olhar e o coração para fora. Mas por que não para dentro, se a único coisa que realmente temos é a nós mesmos?
Enfim, lá estava eu, com tudo o que tanto pedi e reclamei, e mesmo assim ficava triste. E fiquei impressionada ao perceber que criei outras infelicidades. Mas foi só quando parei de me questionar e de me julgar que minha vida melhorou. É preciso atender às nossas vontades só pelo fato de viver com prazer. É claro que temos que lidar com milhões de obstáculos que parecem impedir a realização de um desejo. Mas é essa a graça do jogo: um caça-ao- tesouro da felicidade. É desenvolver e exercitar de olhar em volta e aproveitar o que tiver. É limpar a vista e desobstruir os caminhos rumo à alma. É tirar a poeira das inseguranças alheias, as barreiras dos protótipos de felicidade e virar um pesquisador de si mesmo. E, quando menos esperamos, vem aquela sensação plena, o coração fica maios, e lá vem ela, tão linda: a felicidade. E ela estava bem ali, tão perto que não vimos. Ela está bem aqui, no primeiro ponto de todos: nós mesmos."

Mallu Magalhães Fofa

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011


aquela timidez linda.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

sábado, 24 de dezembro de 2011

Ainda

" - Senhor desconhecido, esqueçamos os gracejos, está bem? Diga-me, antes, a verdade: o que fazemos aqui?
Debrucei-me, aproximando-me ainda mais, como se quisesse que minha cabeça encostasse na sua, que minha vida encontrasse a sua ou, pelo menos, que ela sorrisse. Tolamente, pensei no mesmo instante que, se não o conseguisse, minha vida inteira estaria estragada:
  - Quer, então, saber o que fazemos aqui. Poderia responder, simplesmente, que os dois tentamos transformar um encontro aparentemente fortuito em uma história que pode perfeitamente, com alguma sorte, se estabelecer sob o signo do destino, que tem mais imaginação do que nós.
A jovem confeiteira sabia ouvir muito bem. Em silêncio, parecia recolher minhas palavras, antes de decidir se encontraria logo um lugar para elas no livro da sua vida. Depois, se sacudiu:
  - Chamam-me Liatt. - disse.
Meu coração deu um salto: não havia dito "chamo-me", mas "chamam-me". Nunca conhecera qualquer mulher com aquele nome. É uma palavra hebraica. Significa: és minha. Repeti:
  - Li-att.
Finalmente, como se parasse de resistir, seu rosto oval e belo, com traços harmoniosos, se iluminou com um sorriso.
  - Poderia lhe dizer meu nome próprio, aquele que sempre usei até agora. Mas, somente para a senhora , gostaria de inventar um novo.
Ela aguardou. O sorriso pareceu se aprofundar. Reconciliava tristeza e alegria, fervor e graça, nostalgia do passado e cumprimento do instante. Febrilmente, procurei entre os nomes bíblicos, proféticos e talmúdicos, um nome especial, singular, único, que refletisse o momento que eu acabava de viver e aquele que viria.
Olhei-a intensamente, esperando encontrá-lo nela. Assim, já que me presenteara com Liatt, lhe ofereceria meu novo nome:
  -E, então? - disse. - O tal nome, encontrou? Estou esperando.
Eu gostei de vê-la esperar.
- Um nome. Hebraico, como o seu. Uma sílaba: Od.
- Que significa o quê?
- Tem dois sentidos. Od com um ayin quer dizer: ainda. Com um aleph, a palavra poderia significar: obrigado, eu agradecerei.
Estaria emocionada? Ela pegou minha mão e disse:
- Ainda.
Há muito tempo não me sentia tão transtornado.
Nem tão aflito.